Oats Studios – o laboratório de filmes experimentais de Neill Blomkamp

Essa série me chegou indicada pelo Edson Aran, na sua coluna na revista Bula. Entrou no catálogo da Netflix em 2017, mas desde então não tinha sido notada pelo meu radar, que na verdade não é nem um pouco calibrado para novidades. O Aran também só escreveu sobre em 2021.

Oats Studios é encabeçada por Neill Blomkamp, cineasta sul-africano que chamou a atenção do mundo no seu primeiro longa, Distrito 9 (District 9, 2009). O trabalho seguinte, Elysium (2013), recebeu várias críticas negativas, mas teve a mesma aceitação positiva por parte do público. Chappie (2015) manteve a regularidade. O que os três filmes têm em comum? Abordam como a tecnologia pode ser instrumentalizada para aumentar a desigualdade e promover desumanização na sociedade. Suas histórias são tramas permeadas por violência urbana, auxiliadas por efeitos especiais bem acima da média, em uma estética de “futuro envelhecido”.

Daí então Blomkamp parece ter querido ir além, desenvolvendo uma série reunindo todos os seus pontos fortes. Tinha tudo pra dar certo e deu, só não obteve sucesso comercial. Pouca gente viu e parece que quem viu, quis manter segredo. O número de usuários que avaliaram a obra e comentaram sobre no IMDb é ridículo. Dos que comentaram, quase unanimidade detonou. 

Ao longo de sua carreira, o diretor chegou a ser chamado pelo Peter Jackson para trabalhar na adaptação cinematográfica do game Halo e quase foi escalado para as franquias Alien e Robocop. Antes da pandemia, pretendia fazer “Inferno”, um filme sobre fenômeno extraterrestre no deserto do Novo México. Como o projeto entrou na gaveta, lançou Na Mente do Demônio (Demonic, 2021), um filme de terror que não foi bem recebido.

Oats Studios é composto por 10 episódios curtos. O maior deles tem 26 minutos. Alguns são minúsculos, com 4 minutos. O primeiro, Rakka, é uma história de invasão alienígena. Seres reptilianos invadem a Terra e nos transformam em gado. Fazem experiências bizarras com os humanos, detonam a atmosfera e decoram a torre Eiffel com restos humanos. A resistência é minúscula, liderada por uma militar interpretada pela Sigourney Weaver com a ajuda de uns malucos, como um incendiário psicótico mas genial. 

O segundo, Firebase, mantém o mesmo nível de bizarrice e violência. Acho até que vai além. Algo nível Arquivo X rolando em plena guerra do Vietnã. Uma criatura chamada pelos locais de ‘Deus do Rio’ tem feito umas barbaridades que chamaram a atenção em meio a uma guerra mais que bárbara. Assim, o governo americano envia um tipo de agente especial da CIA para resolver o problema. A visão da criatura coberta por uma espécie de armadura formada pelas carcaças de animais é uma das mais brutais do cinema de terror. 

Esses dois primeiros episódios já conquistam um espectador mais exigente para o tema terror/ficção científica. O problema é que a partir de então a diversão continua, mas de forma precarizada e instável, inserindo esquetes cômicas que podem provocar reações imprevisíveis no público, especialmente os Bad President e Cozinhando com Bill. Kapture: Gafanhotos para um filler de Distrito 9.

Zigoto eleva novamente o nível, apresentando uma história futurista na qual um cientista ferido e uma mulher de casta inferior, vivida pela Dakota Fanning, tentam fugir de uma monstruosidade em um laboratório secreto nível o game Half Life. 

Os episódios curtos possuem alívios cômicos que podem ser nojentos, apenas absurdos ou ainda ininteligíveis, mas é o tipo de conteúdo que te deixa sempre na expectativa do imprevisível. Não dá pra saber o que vem a seguir, gerando uma sensação ótima. Outros ainda parecem apenas sketchs de peças que não puderam ser desenvolvidas por restrições orçamentárias, e são algumas das reclamações recorrentes entre espectadores. Destes, Gdanski é o mais incompleto de todos. Um minúsculo episódio animado que não faz nenhum sentido, parece ter sido feito apenas para apresentar a capacidade do estúdio para esse tipo de animação.

Ainda sobre os cômicos, destaco os de Deus, onde o onipotente em pessoa observa o planeta que ele criou, como uma grande maquete, e fica ordenando ao seu mordomo que envie desgraças e desastres contra os humanos, de acordo com o seu humor instável. 

Quem curte a série Death, Love and Robots muito possivelmente também gostará de Oats Studios. É a mesma vibe, o mesmo gosto pelo inusitado, pela fantasia sem limites. 

O canal oficial da série no Youtube, disponibiliza vários episódios de forma gratuita, além de alguns extras.