Styx – Desespero no caminho do paraíso

Rike (Susanne Wolff) é uma médica que trabalha atendendo situações de emergência, em uma ambulância. Seu objetivo profissional é prestar os primeiros atendimentos médicos e garantir que o paciente ao menos chegue com vida a um hospital. Sua profissão e área de atuação serão essenciais para entender seu comportamento ao encontrar uma situação trágica em alto mar e sua incapacidade de seguir a lógicas e as instruções das autoridades marítimas.

Talvez por puro interesse pela natureza, pela necessidade de se isolar por um tempo, de esquecer as tragédias que vivencia no trabalho, para vencer um desafio interno ou por tudo isso e outras coisas que o filme não se importa em explicar, nem necessita, Rike pretende velejar até a Ilha de Ascensão, localizada no Atlântico Sul, pertencente ao território britânico. Em vários momentos da viagem, ela se detém a observar fixamente fotografias das paisagens naturais do lugar no livro “The Creation of Paradise – Darwin on Ascencion island”. O local foi visitado em 1836 por um jovem Charles Darwin ao final de sua missão, de ir aonde nenhum naturalista fora antes, a bordo do navio Beagle. Darwin transformaria um local inóspito e coberto por cinzas de atividade vulcânica em um paraíso tropical.

Ascensão era um local árido. Devido à ausência de vegetação, a pouca chuva que caia evaporava rapidamente. A ideia de Darwin, posta em prática pelo explorador Joseph Hooker, seria plantar mais árvores para reduzir a evaporação da chuva e criar um solo argiloso. A partir de 1850, navios da Europa começaram a levar para a ilha uma grande variedade de plantas da Europa, África e Argentina. Assim, nascia um éden.

A viagem é longa e solitária, um verdadeiro desafio. Naturalmente, o filme é lento e contemplativo, permitindo ao espectador observar bem as belas paisagens marítimas, fornecendo uma verdadeira imersão na rotina de um velejador em mar aberto. A primeira hora da película é quase totalmente silenciosa, a não ser pelos breves contatos, via rádio, que a protagonista tem com um navio na mesma rota e com a guarda costeira.

Os problemas em sua viagem rumo ao paraíso se iniciam não por questões naturais inerentes ao risco da travessia, como o encontro com uma tempestade, mas por questões geopolíticas. Rike encontra no caminho uma embarcação parada, em processo de naufrágio, repleta de refugiados possivelmente do continente africano. Ao avistarem o veleiro, o pânico e desespero leva alguns a pularem ao mar, tentando nadar para o que representaria a única salvação. Apenas um adolescente de 14 anos consegue alcançar a pequena embarcação.   

Styx, que até então evocava sensações de deslumbramento e relaxamento por meio de sublimes planos abertos do alto mar, começa a provocar angústia, apresentando a incapacidade da médica frente ao aparente descaso da guarda costeira ao pedido urgente de resgate. Uma mulher cuja carreira é dedicada a socorrer imediatamente pessoas em risco, é forçada a se manter fria aos apelos desesperados de pessoas prestes a morrer. Como fantasmas, é possível ouvir seus gritos assombrados ao longe, intermitentes, pedindo por uma ajuda impossível. Essa terrível situação aparentemente sem solução, se conectando com a atual crise global dos refugiados, provoca uma guinada no longa.

Pelo ambiente, lembra produções como Até o Fim (All Is Lost, 2013), estrelada por Robert Redford, onde o velejador passa todo o tempo da silenciosa película tentando evitar que seu barco naufrague. Ambos são filmes engenhosos, capazes de manter a atenção do público de forma incomum, ainda que quase sem diálogos, apenas imagem e movimento. Enquanto um apresenta uma luta intensa de um homem pela própria sobrevivência em uma situação adversa, outro mostra uma mulher lutando contra seus instintos, em uma situação tão adversa quanto, para salvar pessoas totalmente desconhecidas, deixando um sonho de vida para trás.  

A mensagem é até irônica. Enquanto a médica tentava chegar ao paraíso, os refugiados fugiam do inferno. É o tipo de narrativa que depende demais da capacidade de atuação do elenco, no caso, a alemã Susanne Wolff, em sincronia com o diretor e roteirista Wolfgang Fischer, austríaco com poucas produções no currículo. Styx é um dos grandes filmes de 2018, se destacando em uma longa lista de festivais em que vem sendo exibido.

Styx (2018)
Gênero: Drama
Diretor: Wolfgand Fischer
Elenco: Susanne Wolff
Duração: 1h43min