Já posso começar afirmando que é um dos livros mais divertidos que li na vida. O autor imprime à narrativa um tipo de humor bastante semelhante a de séries inglesas como Peep Show, White Gold e The Inbetweeners, onde muito da graça está na autodepreciação dos personagens.
Conheci Adão Iturrusgarai nos tempos de sua parceria como o quarto amigo, dentre o trio Angeli, Laerte e Glauco da saudosa Chiclete com Banana. Lá atrás pela década de 1990 o cartunista resolveu que queria se tornar internacional e partiu para uma terra onde o humor era referência, mas encontrou em Paris uma realidade tão dura quanto a do Brasil no campo da nobre arte sequencial.
Quando finalmente consegue um veículo para publicar seu trabalho, descobre que não vai receber remuneração alguma em troca. Assim, tenta se virar do jeito que dá para conseguir uma grana e se sustentar enquanto a fama não vem.
Adão faz amigos, bebe, fuma, consegue parceiras sexuais, tem sonhos acordados que beiram o delírio, tamanha a empolgação sempre que algo parece que pode acontecer, seja uma noite de sexo ou uma vaga no periódico dos seus sonhos junto a tantos artistas que admira.
O problema talvez tenha sido que o cara colocava as expectativas nas alturas e, claro, não dava tanta sorte e às vezes não tinha o talento necessário para o que se propunha, como quando tenta se fixar fazendo ilustrações realísticas para uma marca de roupas fugindo totalmente de seu estilo cartunesco.
Simpático mas meio atrapalhado, Adão consegue por diversas vezes se auto sabotar, o que provoca uma certa ira no leitor que se pega dizendo “Porra, Adão! Mas tu tinha de fazer essa merda?”. Isso é positivo porque demonstra que estamos torcendo por ele. Pior que, sabendo da competência do cara no ramo, é incompreensível Iturrusgarai não ser aceito logo de cara. Mas é aquilo que terminamos aprendendo cedo ou tarde: apenas talento não basta para ter sucesso em campo algum.
Quando terminamos a jornada de Adão pela França sentimos uma certa sensação de pesar, de termos presenciado o fracasso do protagonista em sua missão. Sentimos a tristeza que ele sentiu ao ter de regressar ao Brasil após pouco menos de um ano de lutas, todas com finais patéticos.
Mas aí então lembramos que a vida tem mesmo passagens amargas, isso quando olhamos sob alguns ângulos. Verificando a carreira do nosso cartunista, ele se deu muito bem. Se seus sonhos não se realizaram como esperava, teve uma experiência fantástica, fez amigos, conheceu amores, esteve onde poucos de nós estivemos e estarão até o fim do percurso por aqui.
Adão ousou, tentou e, se as coisas não funcionaram lá, deram certo de outras maneiras. Assim, na verdade foi um grande sucesso agora registrado em um ótimo livro que já conquista o leitor com poucas linhas.
Sua passagem por Amsterdã foi relatada em sua newsletter ao longo de alguns meses, com trechos curtos todas as semanas. Possui a mesma qualidade deste livro. Agora, Adão está contando do mesmo modo a viagem por Barcelona.
Paris Por um Triz
Autor: Adão Iturrusgarai
Editora: Zarabatana
Nº de páginas: 264