A Eclosão do Twitter

“O Twitter não serve para nada!”, repetiu. Tentei expor que o microblog não era utilizado apenas para que o usuário informasse o que estava fazendo, coisas anêmicas do cotidiano como ‘trabalhando’ ou ‘almoçando’, mas que tinha ido além, servindo para transmitir rapidamente informações sobre o que está acontecendo, se tornando um grande aliado do jornalismo, estimulando revoluções populares e sendo utilizado em campanhas presidenciais. “Para nada!”, ele enfatizou ainda mais resoluto. Assim como esse amigo, ainda hoje muita gente acha que o Twitter é a rede social mais inútil de todas.

A confusão acerca da utilidade do Twitter foi por um longo tempo também motivo de discussão intensa entre seus criadores, o que explica muita coisa sobre sua aparente baixa capacidade de engajamento entre o público, sempre ficando atrás de outras redes sociais que parecem mais convidativas.

Lançado pela Editora Portfolio-Penguin, o livro A Eclosão do Twitter, de autoria de Nick Bilton, repórter do New York Times, narra a construção dessa ferramenta que se tornou essencial especialmente no jornalismo e na política. É no Twitter onde as informações chegam primeiro. É lá onde nascem os memes que depois são exportados para o resto da internet. É o local onde 140 caracteres (hoje são 280) podem ecoar mundialmente, se tornando até matérias de jornais, tais os de Trump.

Por meio de várias entrevistas com pessoas que participaram direta ou indiretamente da história do microblog, Bilton narra de forma até demasiada minuciosa, descrevendo ambientes e estados emocionais dos protagonistas, o passo a passo da construção de uma das grandes marcas da internet. Trata-se de uma história com todos os elementos de um grande filme, uma obra que vai até o âmago dos personagens, dissecando os traços de personalidades e sentimentos que impulsionaram uma ideia vaga e desconexa que ganhou nome, forma e, se não dominou o mundo, segue firme no páreo.

O livro cobre os acontecimentos que foram importantes para a plataforma até meados de 2012, quando o terceiro CEO da empresa assumiu o direcionamento em um clima de egos partidos, expectativas altas e sede por lucro. O livro começa com um dos protagonistas vomitando em um cesto de lixo após uma facada espiritual nas costas, daquelas que apenas os aliados sabem como acertar, já alertando o leitor do que está por vir.

A história do Twitter é a história de um sonhador determinado que deixa sua cidade de origem, um município rural, em busca do sucesso rápido no boom das “empresas.com”, chegando a convencer o próprio pai, um fazendeiro sem muitos recursos, a investir suas economias em um negócio que não deu certo. É a história de @Ev, um cara que aprendeu programação sozinho e criou o Blogger, uma ferramenta que revolucionou o uso da internet para além do Geocities do Yahoo.

Logo ele descobriu que basta dar um microfone a um número suficiente de pessoas para que alguém acabe ofendendo outra pessoa.

Com o sucesso da plataforma, @Ev foi parar em meio aos engenheiros diplomados do Google, mas preferiu deixar o ambiente opulento para trás e investir em um negócio com seu vizinho, @Noah, montando a empresa Odeo, uma start-up que pretendia desenvolver uma espécie de blog usando áudio. A Odeo se tornou um grupamento de guerrilheiros da informática, situado em um prédio onde mendigos dormiam nas escadas, integrado por amigos de amigos, incluindo @Jack e @Biz, um bando de caras sem diplomas. Foi desse caldo sortido de ideologias subversivas e cultura underground que emergiu o Twitter.

A vibração do celular levou-o a pensar nos impulsos do cérebro que fazem o músculo se contrair e relaxar: “Twitch”! Não, isso não funcionaria, ele pensou.

Um dos pontos mais interessantes do livro de Bilton é a capacidade do autor de revelar o íntimo dos protagonistas, de como suas personalidades ficaram entranhadas no Twitter, o tornando um serviço diferenciado apesar do conceito minimalista. Por exemplo, são muitas as diferenças entre o Facebook e o Twitter, mas a principal não está visível nas interfaces. Trata-se dos princípios éticos. O Twitter imaginado por @Ev sempre estaria disposto a se manter neutro e a defender o sigilo do usuário. Foi principalmente para se manter fiel a esses princípios que o grupo recusou vender o microblog para Zuckerberg ou para o Google, chegando a sofrer até retaliações por isso.

O Twitter e o  Facebook eram duas empresas completamente diferentes, com objetivos diferentes e, na opinião de Ev, com princípios morais completamente diferentes.

Outros pontos de destaque que o livro traz são a influência da plataforma na “Primavera Árabe”, uma série de protestos em países do Oriente Médio e norte da África, a utilização na campanha presidencial de Obama, o convite para participar de uma reunião no Afeganistão com o objetivo de contribuir com novas ideias para a reconstrução do país, e outros acontecimentos tragicômicos, como o assédio de celebridades na sede da empresa. Tudo isso em meio às disputas internas movidas por sentimentos de traição e ego exacerbado.

De 2012 até então, o Twitter acrescentou várias funcionalidades, como a possibilidade de publicar imagens, gifs e vídeos, além de ter expandido o número de caracteres. Também saiu da receita zero, algo que os acionistas já exigiam há tempos e motivo usado como desculpa para o corte de alguns CEOs.

A Eclosão do Twitter é um livro indicado para empreendedores, sonhadores e usuários fieis. Porém, longe de ser apenas um livro sobre negócios, funciona como entretenimento puro. Uma história de como quatro caras firmaram amizade em torno de uma ideia, falharam, se reagruparam, tiveram sucesso e depois brigaram entre si. Acima de um conto sobre os bastidores de uma grande empresa da área da informática, é uma história sobre seres humanos e suas idiossincrasias.

A Eclosão do Twitter – Uma aventura de poder, dinheiro, amizade e traição
Autor: Nick Bilton
Editora: Portfolio-Penguin
Capa comum: 320 páginas