O sensacionalismo é um recurso apelativo para atrair atenção, para aumentar os números de audiência para garantir a sobrevivência de emissoras de televisão e seus programas. Além de imagens fortes, palavras fortes. Assim, incentivados por um retorno fácil, se proliferaram programas policialescos, comentaristas e apresentadores polêmicos. O programa “Grande Debate” da CNN se tornou talvez o mais conhecido do quadro da emissora por aqui graças às polêmicas que circulavam nas redes sociais após cada edição.
Pregadores na televisão se tornaram uma atração tristemente comum no país, sejam em emissoras declaradamente religiosas como a TV Aparecida ou alugando horário em emissoras comuns como a Band e o SBT. Com o advento do Youtube, pessoas comuns tiveram a chance de bancar suas próprias opiniões, de fazer suas próprias pregações. Assim começou Felipe Neto com seu “Não entendo” ou algo parecido, onde fazia caras e bocas de pós-adolescente em revolta contínua detonando Crepúsculo e afins.
Rede de Intrigas (Network, 1976) é um filme que aborda o sensacionalismo na televisão. Quando o principal telejornal da emissora UBS começa a apresentar queda de audiência, a cúpula do canal resolve substituir o tradicional âncora Howard Beale (Peter Finch). O veterano, passando por problemas pessoais, não processa bem a demissão e declara ao vivo que pretende se matar no ar na próxima semana, o que enseja sua retirada imediata do ar. Porém, ao perceber que o anúncio suicida do jornalista aumentou a audiência, Diana Christensen (Faye Dunaway), contratada para renovar os programas da empresa, consegue convencer os superiores a manter o âncora suicida no ar, sob protesto do diretor Max Schumacher (William Holden).
Beale termina ganhando um programa como atração principal, no qual se torna uma espécie de profeta revoltado denunciando a hipocrisia dos tempos, acompanhado de outros quadros bizarros. Tudo ia bem até o jornalista resolver abrir a boca sobre os países árabes e suas influências sob os Estados Unidos, atrapalhando a venda milionária da emissora e atraindo a cólera do dono.
Diana é uma mulher fria e calculista, capaz de fazer qualquer coisa para manter os níveis de audiência altos. O relacionamento contraditório que inicia com Max, um homem que preza a ética jornalística, aparentemente não faz sentido, mas se guia pelo pragmatismo dela: sexo sem amor. Sem perceber, Max faz a mesma coisa, trocando a esposa por uma mulher mais nova.
Beale, o novo profeta, desamparado emocionalmente e sem rumo, embarca cada vez mais em seu papel, emocionando a audiência e se tornando o que hoje é chamado de “influencer”, um homem capaz de manipular meia América pronunciando uma série de bobagens emocionadas. Ainda assim, deixa escapar que está consciente do papel que faz, fato que fica claro quando aceita ser subjugado pelo dono da emissora, que o orienta a mudar o alvo de sua ira, se tornando mais conciliador e projetando no público a ideia de que o mundo é um negócio e que as grandes corporações os novos guias e deuses da humanidade.
Rede de Intrigas desenvolve bem a trama, apresentando as contradições dos personagens principais, seus pecados, fragilidades e descortinando o mundo dos negócios televisivos, uma espécie de Wall Street onde todos os movimentos são calculados para extrair o máximo de dinheiro o mais rápido possível sem nenhum tipo de responsabilidade pelas consequências resultantes da manipulação de ideias e pessoas. Frank Hackett (Robert Duvall), um dos diretores que apoiam as ideias radicais de Diana, poderia ser o Gordon Gekko do filme, ainda que na verdade se revele apenas mais um peão que quer sobreviver a qualquer custo.
O recurso do narrador incomoda, mas não é tão relevante porque só atua em momentos pontuais, ainda que não houvesse necessidade. Os diálogos, volta e meia, soam um pouco teatrais, engessados. É um filme de cubículos, que se passa totalmente nas dependência da emissora ou em residências. Pessoas fechadas em caixas discutindo o que deverá ser transmitido em caixas. O resultado foi a vitória de 4 Oscars, incluindo Melhor Ator para Peter Finch, Melhor Atriz para Faye Dunaway e Melhor Roteiro, e a indicação em outras seis categorias.
Cenas Marcantes:
Rede de Intrigas (Network, 1976)
Diretor: Sidney Lumet
Gênero: Drama
Elenco: Faye Dunaway; William Holden; Peter Finch; Robert Duvall
Duração: 2h1min