Profissão: Ladrão (Thief), o primeiro longa metragem dirigido por Michal Mann, chegou aos cinemas em 1981. A crítica na época demonstrou surpresa pelo fato de que um diretor inexperiente conseguiu entregar um filme tão inteligente, com uma narrativa sóbria conduzida de forma clara, sobre a vida de um assaltante profissional. Embora fosse mesmo um diretor sem experiência no início dos anos 80, Mann não era um novato qualquer.
Graduado na London Film School, o cineasta passou sete anos aperfeiçoando suas habilidades em comerciais para televisão e observando o trabalho de diretores como Alan Parker, Adrian Lyne e Ridley Scott. Nos Estados Unidos, dirigiu vários episódios da série Starsky and Hutch, trabalhou em Vega$, Police Story e, em 1979, dirigiu A Maratona Final (The Jericho Mile), um especial para a televisão sobre um presidiário sentenciado a prisão perpétua que se vê frente à oportunidade de disputar as Olimpíadas graças a suas habilidades de corrida. O filme foi premiado com três Emmy, mostrando que Mann já estava pronto para o próximo passo.
Uma espécie de noir moderno que se passa em Chicago, Profissão: Ladrão conta a história de um ex-presidiário chamado Frank, que ganhou a reputação de ser extremamente profissional, um ladrão de alto nível especializado em diamantes. O protagonista, interpretado por James Caan, é um solitário, um homem dedicado ao trabalho mas que sonha em construir uma família. É o tipo de personagem soturno, capaz de apontar sua arma até para a cabeça do presidente dos Estados Unidos em pessoa para cobrar dois dólares e que costuma cumprir suas ameaças.
Durante o desenrolar da história, Frank termina por se aliar temporariamente a um grupo de gangsters liderado por Leo (Robert Prosky), atraído pela famigerada oportunidade de dar o último grande golpe e se aposentar. No início, os interesses de todos parecem estar alinhados, mas a ação atrai a atenção de um grupo de policiais corruptos que se mostrarão menos problemáticos que os próprios bandidos.
O filme foi baseado no livro The Home Invaders: Confessions of a Cat Burglar, de 1975, que conta a história real de John Seybold, um ex-ladrão de diamantes. Mann afirma que apenas usou o conceito principal do livro para construir a sua própria narrativa. Os críticos elogiaram a adaptação cinematográfica conduzida pelo estreante na telona e o resultado foi uma boa arrecadação nas bilheterias. Profissão: Ladrão marcou o estilo de direção do cineasta e o tipo de tema que ele voltaria a abordar em outras produções, como Fogo Contra Fogo (Heat, 1995).
“A ideia de criar esse personagem era de mostrar alguém que esteve fora da sociedade. Um outsider que esteve fora da evolução de tudo, desde a tecnologia à música que as pessoas ouvem, a como conversar com uma garota, o que querer da vida e como conseguir”, comentou o diretor sobre a construção do protagonista interpretado por Caan. Durante o tempo que passou na cadeia, mais de uma década, ele criou um conceito pessoal de como construir sua própria vida ideal e até mesmo colocou isso no papel, criando um mosaico de imagens que carrega sempre consigo. Ao ser libertado, começa a pôr em prática esse projeto. Quando parece que está prestes a conquistar tudo, percebe que se trata de algo mecanizado, uma espécie de desejo que partiu do mundo a sua volta e não dele mesmo. Tudo sai do controle e ele retorna à escuridão de sua vida anterior, na cadeia.
Michael Mann deixa claro, pelo modo como conduziu o filme, seu compromisso com a realidade, em tornar a história fascinante justamente pelo fato de que poderia mesmo acontecer. A personalidade de Frank é moldada pelo próprio sistema, que condena um homem à cadeia por um roubo de 40 dólares. Ao revidar violentamente uma tentativa de estupro coletivo perpetrada com o auxílio de agentes do Estado, tem sua pena aumentada duramente, e o Estado termina por devolver um homem completamente diferente à sociedade, alguém não mais disposto a obedecer, mas a quebras regras e invadir cofres.
O diretor chegou a contratar ladrões de verdade como consultores, passando instruções para o ator Michael Caan de como ser convincente. As ferramentas utilizadas no filme são reais, com algumas pesando até 200 Kg. O resultado é que o espectador é convencido que está vendo uma autêntica operação de roubo em ação. As cenas de ação trazem o mesmo acento poético visto nas produções de Sam Peckinpah, com sangue espirrando pelas paredes enquanto corpos se contorcem violentamente perante o impacto do chumbo disparado por elementos inescrupulosos.
Além do diretor, outras figuras do elenco também fizeram seu debut no cinema nesta produção. Foi o caso de Dennis Farina, Robert Prosky, William Peterson e James Belush. Aqui fazendo o papel de coadjuvante como o braço direito em campo de Frank, Belush experimentou uma boa popularidade na década de 80, chegando a atuar ao lado de Arnold Schwarzenegger em Inferno Vermelho (Red Heat, 1988).
Analisando puramente o roteiro, não encontramos na verdade nenhuma novidade. Profissional do crime se alia a um grupo mafioso, enfrenta a pressão de uma força policial corrupta, é trapaceado e reage violentamente. O que abrilhanta a produção é a condução de Michael Mann e a dedicação de elenco e equipe técnica transformando Profissão: Ladrão em um espetáculo visual que até hoje é usado como inspiração para cineastas que revisitam de forma séria o sub-gênero de filmes de assalto.
Mann se revelou logo no início um mestre na arte de construir uma trama urbana, com um amplo controle do uso de luz e sombra e habilidade para retratar o submundo perverso das grandes metrópoles americanas.
Profissão: Ladrão (Thief, 1981)
Diretor: Michael Mann
Gênero: Ação; Crime; Drama
Duração: 122min