Os Estranhos Capítulo 1 – Uma pobre imitação de si mesmo

Dentre a fornada de filmes “home invaders” da segunda divisão mais famosos dos últimos anos, como Temos Vagas (Vacancy, 2007), O Colecionador de Corpos (The Collector, 2009), Você é o Próximo (You’re Next, 2011) e Hush: A Morte Houve (Hush, 2016), quem tinha mesmo mais potencial para se tornar uma franquia era Os Estranhos (The Strangers, 2008), talvez o mais convencional da lista. 

Temos Vagas recebeu uma sequência em 2008, mesmo ano da estreia de Os Estranhos, que só veio a ganhar uma parte dois uma década depois, chamado Caçada Noturna (The Strangers: Prey at Night, 2018). O longa foi avaliado em geral como inferior ao original, mas aponto que teve mais acertos que erros. Ignorando o fato da vitalidade do assassino da máscara de estopa ser ao nível do Michael Myers da franquia Halloween, afirmo que chega a ser mais memorável que o primeiro filme. 

A afirmação de ser baseado em uma história real atiçou a curiosidade mórbida do público ou é o fato de que o gênero terror exige pouco mesmo para justificar uma franquia, com vem sendo desde o final da década de 1970, quando surgiu o primeiro Halloween. 

Mas houve mesmo casos na vida real de invasores de casas usando máscaras de estopa, de pin-up e de boneca apenas pelo prazer de aterrorizar e matar algum desconhecido? O diretor do primeiro longa, Bryan Bertino, e também roteirista de todos os filmes até aqui, confirmou que, na verdade, sua obra é baseado em não um, mas em três acontecimentos reais. 

O primeiro foi a série de homicídios cometida pela família Manson, que culminou no assassinato de Sharon Tate em Los Angeles. O segundo remonta a 1981, em um resort em Keddie, Califórnia, onde quatro pessoas foram assassinadas e o caso nunca foi resolvido. O terceiro fato real foi uma vivência do próprio Bertino. Em uma noite, quando seus pais não estavam em casa, alguém bateu à porta perguntando por uma pessoa que não morava lá. A experiência pessoal, aterrorizante segundo ele, foi transposta para o filme. 

Dessa vez os produtores apostaram alto e Os Estranhos: Capítulo 1 (The Strangers: Chapter 1, 2024) chegou aos cinemas como a primeira parte de uma trilogia. 

Mesmo contando com 3 roteiristas dessa vez, um deles sendo o próprio Bryan, o resultado de Capítulo 1 é decepcionante em todos os níveis. Muitas cabeças se juntaram, mas nenhuma ideia nova, nenhuma boa ideia, nem mesmo uma razoável, que justifique mais do que 80 minutos de película, surgiu. 

Casal em viagem de férias, May (Madelaine Petsch) e Ryan (Froy Gutierrez), se vê preso em uma cidadezinha após problemas mecânicos no carro. O que seria apenas uma noite em um airbnb no meio do nada se torna um desafio desesperador quando três pessoas mascaradas e armadas com facas e machados armam um assédio implacável contra o casal. Nada exatamente diferente dos filmes anteriores, ainda que os resultados alcançados tenham divergido.

Um dos segredos do sucesso para esse tipo de filme funcionar é criar bons personagens, protagonistas que façam com que o publico simpatize com eles, que torça por suas vidas. Quando a audiência passa a não se importar com eles ou, pior ainda, passa a torcer pelos vilões, é sinal que tudo foi feito na mais pura preguiça e piloto automático. É o que acontece aqui. 

O casal protagonista não chega a ser irritante, ao menos no início do filme. Há uma legítima tentativa de construir personagens simpáticos, com características próprias, mas não se obtém sucesso. Não há nada demais neles, é só um típico casal jovem apaixonado, sem nenhuma característica individual notável, como já visto em dezenas de títulos do mesmo subgênero.

O filme desanda de vez quando cometem as contumazes burrices, como ficar proferindo ameaças vazias contra uma mulher mascarada e armada com uma faca que desdenha completamente do rifle apontado para ela enquanto o público grita mentalmente “ATIRE LOGO”.  

Os habitantes locais parecem, na maioria, a caricatura de caipiras que detestam gente da cidade, buscando qualquer tipo de coisa que considerem um desrespeito, imoral ou uma fraqueza. Na cena da lanchonete há até um princípio de simpatia por parte de alguns, mas logo todos mostram algum nível de hostilidade, principalmente o mecânico local. 

O final deixa parecendo que o filme na verdade é como se fosse apenas o episódio piloto de uma série ou, pior ainda, um longa cortado pela metade, algo incapaz de justificar duas partes e nem um pouco memorável para que mantenha uma audiência esperando ansiosamente pelo que vai acontecer no próximo filme. Pelo silêncio que se fez, ninguém está mesmo dando a mínima para a parte dois. 

A trilogia já foi completamente filmada, então só resta lamentar. O Capítulo 2 está previsto ainda para esse ano, e a terceira parte para 2025. 

Cenas destacadas

A aparição: Uma garota bate à porta chamando por alguém que não mora naquela casa. Maya atende e começa o prenúncio da série de tormentos pelos quais ela e o namorado passarão no lugar. 

O erro: Atacado por mascarados, Ryan tenta reagir por impulso, mas comete um erro mortal, que vai enfraquecer seu espírito, o desarmando para o nível de violência que seria necessário para sobreviver ao assédio. 

O que é que há, velhinho? Ryan consegue surpreender uma das invasoras e a mantém sob a mira de sua arma, mas ela, como em um episódio de Pernalonga, começa a desdenhar de suas ameaças.

Os Estranhos: Capítulo 1 (The Strangers, Chapter 1, 2024)
Direção: Renny Harlin
Gênero: terror
Elenco: Madelaine Petsch; Froy Gutierrez
Duração: 1h31min