Uma ficção científica distópica tem mais potencial para aterrorizar um adulto que um filme de terror convencional, com demônios e serial killers. Os mais pessimistas ou realistas são tomados por uma espécie de pressentimento de que caminhamos para um futuro catastrófico, onde a escalada da implosão dos direitos humanos modelou uma sociedade fria que, à beira do colapso total, se mostrou disposta a qualquer coisa pela chance de viver mais um dia.
Em High Life, criminosos são lançados em grupos ao espaço em naves prisão com o propósito de serem cobaias em experimentos científicos extremamente arriscados. O da nave 7 envolve uma viagem aos limites do espaço e utilizar a energia de um buraco negro e voltar para a Terra. O problema é que uma viagem dessa magnitude duraria centenas de anos. Dessa forma, a tripulação deveria se reproduzir entre si e dar lugar a novas gerações que continuariam a missão.
Há um sistema de segurança elaborado para que não ocorram problemas entre os detentos. Todos os dias, deve ser registrado em um computador uma espécie de chip de identificação que mantém o suporte de vida da nave funcionando por mais 24h. Ainda assim, quando a sanidade mental dos ocupantes parece prestes a romper, nem esse método pode ser eficaz.
Dirigido pela francesa Claire Denis, o filme dificilmente agradará o grande público, seja pelo tema pesado, pelo ritmo lento, pela narrativa não totalmente linear, ou por algumas cenas que se localizam entre o perturbador e a dança contemporânea. Os personagens são desajustados como internos de manicômio. Como é de se esperar em um ambiente claustrofóbico, ocorrem desentendimentos entre eles e a pressão faz explodir a violência gerando situações de estupro e assassinato que são retratadas na tela de forma bastante gráfica.
A cientista Dibs (Juliete Binoche), como uma comandante da equipe, conduz experimentos de fertilidade, colhendo sêmen dos homens e inseminando artificialmente as mulheres da tripulação, obtendo sucessivos fracassos. Há uma câmara unissex de masturbação cuja utilização gera algumas das sequências mais bizarras do longa.
High Life parece ter uma obsessão pelos fluídos corporais. O sêmen, a urina, o suor, a água e o sangue, todos ligados diretamente ao objetivo da cientista: criar vida no insólito do espaço. Os viajantes, a escória rejeitada daquela sociedade, parecem estar em uma missão que pode ser crucial para o futuro da humanidade ou são apenas cachorros Laika enviados para morrer em buracos negros enquanto cientistas na Terra observam confortavelmente o que acontece.
O personagem de Robert Pattinson, Monte, age como um monge que se comporta como um penitente cuja consciência sofre por pecados passados. Opta por não usar a máquina da masturbação e nem participar das experiências de Dibs. E é justamente sua recusa que termina o qualificando como o candidato ideal.
O filme é uma mistura de vários elementos. Junta ideias e teorias de Stephen Hawking (viagem no espaço e buracos negros), mitos gregos como a de Medeia (amor e ódio, filicídio e infertilidade), tabus sociais (incesto) e até temas bíblicos da criação (jardim do Éden e arca).
A obra não segue uma narrativa linear, mas não se torna fragmentando demais, irritante com idas e vidas constantes. Utiliza o artifício para explicar pontuais omissões e enfatizar algumas situações e sensações. Possui cenas desconcertantes e momentos que refletem a extrema solidão de alguém perdido no vazio, oferecendo momentos de tensão garantidos por problemas mecânicos ou abordagem de outras naves como é típico do gênero.
High Life (2018)
Diretora: Claire Denis
Gênero: Ficção Científica; Drama
Elenco: Robert Pattinson; Juliette Binoche; André Benjamin
Duração: 1h53min