Caos ou Determinismo? A franquia Alien vai além do terror espacial em Prometheus e Covenant

Em Clube da Luta (Fight Club, 1999) Tyler Durden avisa que, no futuro, as megacorporações controlarão o planeta. No livro A Era do Capital Improdutivo, o economista Ladislau Dowbor mostra que as grandes empresas, na prática, já capturaram o Estado e assumiram o controle do mundo globalizado. 

No universo apresentado por Ridley Scott em Alien — O Oitavo Passageiro (Alien, 1979), mais especificamente na sequência dirigida por James Cameron, Aliens – O Resgate (Aliens, 1986), vemos que as grandes corporações são uma ameaça, fato também confirmado pelo recente Alien: Romulus (2024)

Sintéticos e Replicantes

Blade Runner, também dirigido por Ridley Scott, apresenta um retrato futurístico de um mundo dominado pelas corporações. Há quem aponte que as semelhanças entre Blade Runner e Alien são tantas que na verdade se passam no mesmo universo fictício, um mundo de disparidades ainda mais acentuadas, no qual temos regiões sucateadas, com estética de futuro envelhecido, onde a massa da população vive, e oásis tecnológicos privados, para uma elite seleta. 

Um ponto de convergência óbvio entre Alien e Blade Runner são os robôs. Em um filme, são chamados de sintéticos. No outro, de replicantes. Em ambos são postos como vilões em algum momento. Uma observação mais demorada demonstra que, tal qual os humanos, existem androides bons e maus. Tudo depende do criador, da programação e também do objetivo para o qual foram construídos. 

A mais primordial questão da humanidade: de onde viemos?

Se Alien nos foi introduzido como um terror espacial, e assim prosseguiu em suas sequências até A Ressurreição (Alien Resurrection, 1997), Prometheus (2012) veio para ampliar definitivamente a saga espacial, injetando mais ficção científica e discussões filosóficos mais aprofundadas.

A promessa foi de contar a origem do xenomorfo, a forma de vida mais hostil já encontrada pelo homem, uma máquina de combate perfeita, representando uma ameaça capaz de exterminar planetas. O resultado para muitos, entretanto, foi de frustração. 

Prometheus contou com um elenco excelente, trazendo Michael Fassbender, Idris Elba, Noomi Rapace, Charlize Theron e Guy Pierce, além de Ridley Scott na direção. Na história, a tripulação da nave Prometheus, seguindo a orientação de um casal de cientistas, Charlie e Elizabeth Shaw, parte para um ponto do universo onde informações sobre a origem da humanidade poderiam ser encontradas. 

Assim, a franquia Alien se alinha ao mesmo objetivo de 2001: Uma Odisseia no Espaço (2001: A Space Odyssey, 1968), onde uma nave tripulada segue o rastro de um artefato que poderia revelar a origem do homem. Se na missão do filme de Kubrick os astronautas eram auxiliados por Hal 9000, uma inteligência artificial incorpórea que revelaria ter interesses ocultos da tripulação, os navegadores da Prometheus contavam com a ajuda de David, um ser sintético criado a imagem e semelhança do homem, mais especificamente de seu mestre, o todo poderoso, mas decrépito pela idade, Peter Weyland. 

Weyland permitira que David fosse uma versão aprimorada, uma peça especial, única, dotada do poder da criatividade, sendo assim mais próximo dos homens que seus pares sintéticos. 

Se a Dra. Shaw tencionava descobrir a origem da vida humana na Terra, um conhecimento que, compartilhado com todos, poderia transformar talvez o mundo, Weyland tinha um interesse próprio, individual. Com idade avançada, ele buscava a fonte da vida, o elixir da imortalidade. 

Componente indesejado em vários filmes de terror, a irritante burrice dos personagens está presente em Prometheus, fato que incomodou bastante espectadores mais exigentes. Mesmo assim, se mostra insuficiente para diminuir a grandiosidade dos temas abordados pelo filme. As principais queixas dos detratores de Prometheus foram no sentido de que este entregou mais novas perguntas que respostas. 

Mas essa frustração é literalmente apontada no próprio filme. Se você descobre quem o criou, vai ter de descobrir em seguida quem foi o criador do seu criador, formando um ciclo interminável de satisfação momentânea seguida de frustração. Descobrimos que uma raça batizada por nós de Engenheiros criou a humanidade. Mas quem criou os Engenheiros?

David tem a vantagem de ter ido mais além. Ele foi criado por humanos, sabe por qual propósito e tem ciência de por quais meios. O ser sintético tem a oportunidade de conhecer o criador de seu criador, um Engenheiro. O encontro resulta em uma enigmática tragédia. O Engenheiro, por algum motivo, rejeita as duas criações à sua frente, o humano e o sintético, agindo como Cronos que devorava seus filhos. 

Se David àquela altura já poderia ser considerado um personagem suspeito no filme, a partir de então ele se tornaria um dos grandes vilões da, não estou brincando, história do cinema. Na sequência seguinte, Alien: Covenant (2017), o androide se tornaria um genocida, um deus louco em delírio permanente. 

Ainda em Prometheus, o Engenheiro despertado por Weyland parece determinado e extinguir a raça humana por meio do patógeno negro, um líquido capaz de reescrever DNA de modo super acelerado e que, em contato com seres humanos, gera uma forma de anti-vida. O xenomorfo segue o princípio do inseto, se reproduzir sem parar e consumir tudo que aparecer à sua frente. 

Ao compreender o perigo que o Engenheiro representa para a humanidade, a Dra. Shaw pede o sacrifício imediato da tripulação da Prometheus para impedir a partida da nave com o patógeno negro. Resta a ela encarar a fatalidade de definhar em um planeta alienígena, sozinha, até que recebe o contato de David, ainda ativo, oferecendo um acordo com o demônio. 

A proposta de David de sair daquele local em direção ao provável planeta dos Engenheiros e assim descobrir mais sobre os segredos do universo é o suficiente para acender a chama da vida na Dra. Shaw. Após achar que salvou a humanidade, seu instinto científico a faz ignorar o perigo e então ela restaura o ser sintético, dando início a uma saga cósmica que espalhará o terror pelo universo. 

Em Convenant parece que os fatos são ditados pelo determinismo, que os eventos são inevitáveis pois são consequências de eventos anteriores. Não há como mudar o destino. 

Uma nave carregando uma tripulação de colonos em criogenia sofre uma avaria devido a um evento imprevisível no espaço, fato que acarreta uma sequência dupla de acasos. Primeiro, o capitão da tripulação morre por conta de um defeito na cápsula criogênica, ocasionado pelo acidente. Segundo, o novo capitão, Oram (Billy Crudup), é um fanático religioso que conta com baixa aceitação entre a equipe. Por conta desses dois fatos, resolve, para agradar seus comandados, desviar a rota em direção a um planeta desconhecido para investigar uma transmissão enigmática. 

Acontece que os dados apontam que o planeta oferece meios para suportar a vida humana, o que pouparia a todos de passarem mais alguns anos viajando pelo espaço. Neste ponto, parecia que não havia outra maneira de os eventos acontecerem. Estava determinado que a ameaça criada pelos Engenheiros iria encontrar um novo caminho para a destruição da humanidade. 

Uma equipe de reconhecimento desce ao novo mundo e um deles entra em contato com o patógeno negro, que está integrado à vegetação local. Mais uma vez, a fusão com um ser humano dá origem a uma criatura hostil, ainda diferente da versão que conhecemos em O Oitavo Passageiro, mas tão mortal quanto. 

A espécie, chamada de Neomorfo, está se aperfeiçoando, e David, que se tornou um estudioso das formas de vida locais, têm na sua mira uma nave repleta de seres humanos com os quais poderá experimentar novas fórmulas. 

Covenant possui mais sequências de ação que o filme anterior, mas ainda há espaço para reflexões que formam o grande destaque do longa. Dentre a tripulação da Covenant, também há um sintético. Walter é visualmente igual a David, mas um produto aprimorado fisicamente, ainda que mentalmente inferior. Ao contrário de David, ele não consegue criar. Este fato o faz um produto mais estável e confiável. Sua devoção à Daniels (Katherine Waterston), uma das tripulantes e a protagonista deste capítulo, é completa. 

David e Walter tentam dialogar, estabelecer um vínculo entre eles. São iguais apenas no exterior. David acredita ser melhor que seu criador, Weyland, porque se acha imortal, mas não percebe que não é verdade, que mesmo seres sintéticos perecem com o tempo. Poderia ter uma “vida” muito mais longínqua, mas mesmo que não seja feito de pele e ossos, seus componentes se deterioram naturalmente. 

O irremediável e trágico destino dos protagonistas da franquia Alien

Ao final de Convenant, o destino trágico que parece se abater em todos os protagonistas da franquia mais uma vez se confirma. Mesmo que sobrevivam ao final do filme, no seguinte descobrimos que acontecera um desastre. A Dra. Shaw se torna cobaia dos experimentos genéticos de David. Daniels provavelmente terá o mesmo destino, enganada pelo ser sintético. 

Ripley, única sobrevivente dos eventos de O Oitavo Passageiro (Alien, 1979), é usada pela corporação para obtenção de uma mostra do Xenomorfo. Sua luta para salvar uma criança em O Resgate (Aliens, 1986) se mostra totalmente inútil em Alien 3 (Alien³, 1992), onde ela mesma encontra seu derradeiro fim. 

Todas as três protagonistas (Shaw, Daniels e Ripley) lutaram bastante, mas apenas adiaram o que parece ser inevitável na franquia, a morte direta ou indireta pelo misterioso óleo negro criado pelos Engenheiros.

Em todos os capítulos da franquia Alien, o futuro é tão estéril quanto o vácuo do espaço. Isso é apresentado com ainda mais clareza no recente Alien Romulus (2024), ambientado inicialmente em uma colônia de mineração, onde os trabalhadores são tratados como lixo pela megacorporação que comanda o local. 

Romulus apresenta uma nova heroína, Rain (Cailee Spaeny). Situado após os eventos apresentados em Alien: O Oitavo Passageiro, não apresenta uma adição significativa à saga espacial, ao menos até então. Resta aguardar se Rain vai ter o mesmo destino das outras três antagonistas da criação dos Engenheiros.