Se afastar da civilização em direção à natureza como férias é uma prática comum. Quatro amigos resolvem aceitar o desafio de descer de canoa as corredeiras de um rio antes que toda a região seja inundada para ser transformada em uma represa. Seria uma luta honesta contra a natureza, mas o imprevisível fator humano termina por se revelar o maior dos riscos na empreitada.
Lewis (Burt Reynolds) faz o tipo durão, o homem que se sente à vontade entre a natureza e seus desafios. Seria um tipo de sobrevivencialista, um sujeito que acredita, e até parece torcer para que aconteça, o mais breve possível, o colapso da sociedade fazendo com que apenas o mais forte e preparado possa sobreviver, como era nos primórdios. Ed (Jon Voight) aparentemente compartilha experiências pretéritas com Lewis, demonstrando também ter alguma habilidade com arco e flecha e outros tipos de combate, mas parece ter renunciado ao uso da violência, optando por ser apenas um homem urbano de família. Os demais do pequeno grupo, Bobby (Ned Beatty) e Drew (Ronny Cox), são típicos cidadãos urbanos, vendedores que apenas aceitaram um convite inocente para um final de semana de acampamento. Ao serem atacados por dois moradores locais, o grupo entra em um confronto mortal que termina propondo uma questão complexa questão moral.
Conforme vamos acompanhando o início da chegada do grupo na região, somos apresentados a um ambiente sombrio, empobrecido, quase pós-apocalíptico. Os moradores são rudes, sujos e maltrapilhos. Alguns apresentam defeitos de formação, o que sugere a prática de incesto e/ou casamento entre parentes. Uma atmosfera de perigo é fomentada em cada cena, alimentada também pela atitude prepotente de Lewis, com o modo com o qual ele lida com as pessoas que encontra, inclusive as desafiando em seu próprio território, como quando tenta chegar ao rio primeiro que os guias.
Os desafios naturais das corredeiras parecem ser difíceis, mas superáveis, porém a situação muda radicalmente quando surgem dois caipiras no caminho do grupo, ocorrendo uma sequência de agressões brutais, retratadas de forma crua e realística, mostrando ao espectador que, naquele ambiente, longe de tudo, sobrevive apenas o mais forte.
Após sucedido o confronto físico, se soma um conflito moral, que leva a mais problemas. Quando a situação previsivelmente se inverte, é Ed que tem de assumir a liderança se tornando a única esperança de sobrevivência do grupo. Esse momento foi preparado anteriormente quando o personagem se mostrou simplesmente incapaz de matar um cervo. Agora, ele se vê obrigado a enfrentar outros seres humanos, revivendo um passado que aparentemente bloqueou.
Amargo Pesadelo é uma obra sufocante que revela situações de vida ou morte em um território que parece seguir suas próprias regras, apesar da presença do Estado revelada pela existência da força policial local. É o tipo de obra que, pela brutalidade excessiva, parece difícil de ser reproduzida pelo cinema atual, ao menos não nesse nível de qualidade. Como toda história de jornada, esta também se revela transformadora, onde os personagens sobreviventes terão suas vidas marcadas para sempre pelo horror da vida real.
Cenas Marcantes:
Amargo Pesadelo (Deliverance, 1972)
Diretor: John Boorman
Gênero: Drama; Ação
Elenco: Jon Voight; Burt Reynolds
Duração: 1h49min