Sete faces da violência

Relembrando sete dos personagens mais durões do cinema de ação.

Quando Sylvester Stallone colocou em prática a reunião em um único filme dos personagens mais icônicos do cinema de ação da década de 80, tratava-se de uma ideia pronta, que todo mundo que viveu sua infância e adolescência vendo Stallone, Schwarzenegger, Van Damme, Dolph Lundgren, Bruce Willis e, mais recentemente, Jet Li e Jason Statham, trucidarem criminosos já havia imaginado. Eu fui um desses adolescentes.

Apesar de já ter pedido em muito o interesse por este tipo de gênero, especialmente por conta da overdose de bobagens ao estilo Velozes e Furiosos, claro que esperei ansiosamente, incentivado pela nostalgia, o que estaria por vir. Se o primeiro Os Mercenários não trouxe realmente nada mais que um filme genérico de ação, afetado em muito pela tendência atual de criar cenas influenciadas por games, a sua sequência assumiu completamente esta estética. Os Mercenários 2 é descaradamente puxado para o cômico, semelhante a um desenho animado dos ruins. É uma classe B sem a elegância de seus pares gerados pela produtora Cannon. Ainda não tive ânimo para conferir o terceiro filme da franquia.

Comecei a lembrar então, como sempre, dos personagens mais obscuros, aqueles que o tempo esqueceu, aqueles cujos títulos não foram exaustivamente repetidos na televisão. Caras realmente frios e durões, mas não caricatos. Profissionais da violência que sabiam o risco de entrar em um tiroteio mas que ao e que eram capazes de congelar o inferno com um olhar. Personagens, acima de tudo, um pouco mais realistas, não infalíveis.

Estes sete certamente seriam capazes de destruir o Boko Haram, desarticular o ISIS, detonar o CARTEL mexicano ou colocar abaixo qualquer conspiração internacional.

The Driver (Ryan O’Neal em O caçador de morte, ‘The Driver, 1978’)

“Eu não tenho amigos.”

Um motorista profissional que trabalha para uma clientela seleta. Ele decide se você pode ou não contrata-lo. Uma vez fechado o acordo, as regras estão seladas e não se pode mais voltar atrás. O Motorista é um solitário por opção. Vive em quartos de hotéis baratos acompanhado apenas pelo som de antigas músicas country reproduzidas por fitas K7. Sem amigos, sem amantes. Aqui temos um western urbano com direito a duelos mortais, perseguições frenéticas e uma disputa de orgulho e honra entre o ladrão e o policial em uma trama na qual nenhum dos envolvidos é inocente. A expressão de não vida que O’Neil usa deixa transparecer um homem sem alma. Um olhar capaz de desconcertar a Morte. Jason Statham e Ryan Gosling o imitaram, mas este é o original. Tão discreto que permaneceu no anonimato.

Dirty Harry (Clint Eastwood em Perseguidor Implacável, ‘Dirty Harry, 1971’)

“Agora você sabe porque me chamam de Dirty Harry. Todos os trabalhos sujos sobram pra mim.”

Ele não possui favoritos. Detesta a todos. Negros, judeus, Chineses e especialmente mexicanos. Logo vemos que se trata de um homem com um raro e elevado senso de justiça. Ao invés de selecionar alguns preconceitos como faz uma pessoa normal, Harry adota a todos e assim exercita um tratamento equânime. Callahan se tornaria o modelo padrão de policial cinematográfico a partir de então. Um profissional que dá resultados ignorando algumas regras e fuzilando os bandidos com sua Magnum 44, o maior canhão de mão até então inventado.

Carter Doc McCoy (Steve McQueen em Os Implacáveis, ‘The Getaway, 1972’)

“Procure Banyon e diga que estou à venda. À seu preço.”

Doc McCoy (Steve Mcqueen) não aguentando mais a dura vida na prisão, faz com que sua esposa, Carol (Ali MacGraw), entre em contato com o político Jack Beynon e consiga sua libertação. Alguns acordos tiveram de ser fechados, incluindo um assalto, a divisão da bolada e uma noite de amor com a esposa do McCoy, que não fica nada feliz quando descobre. Traídos, o casal atravessa então o inferno em busca da liberdade, perseguidos pela polícia e pelo bando de patifes do Beynon. McCoy é um cara durão, mas em conflito. Embora psicologicamente abalado, só resta uma direção a seguir: em frente. Das grandes cenas do cinema de ação, McCoy destrói uma viatura da polícia a tiros de 12. Vale lembrar que a atriz Ali MacGraw era casada, mas depois das filmagens deixou o marido por Mcqueen. Formaram um verdadeiro casal nas telas e fora dela.

Jack Cates (Nick Nolte em ‘48 Horas, 1982’)

“Cansei de ficar rodando por aí. Você me diz a verdade ou vou arrancar de você.”

 

Imagine que o personagem Marv, de Sin City, existisse de verdade, sem todos aqueles exageros que nos quadrinhos e no cinema o tornam quase um incrível Hulk. O que sobraria seria o policial Jack Cates, um representante da lei tão carinhoso quanto urso selvagem. Em 48 Horas, Cates solta o detento Reggie Hammond (Eddie Murphy) para que o ajude a rastrear antigos comparsas. Quando se cansa do jogo, Cates simplesmente tenta tirar resultado na porrada, começando uma briga épica, dando o primeiro golpe de forma covarde e repentina, em uma explosão de ira que só para quando a própria polícia flagra o momento. Decerto nunca houve uma parceria tira branco cruel com criminoso negro metido a comediante como essa dupla.

Stanley White (Mickey Rourke em O Ano do Dragão, ‘Year of the Dragon, 1985’)

“Você está certo, eu estou errado. Desculpe. Queria ser um sujeito decente. Gostaria mesmo. Eu apenas não sei como.”


O Capitão Stanley White assume o comando da polícia em Chinatown logo após um massacre ocorrido em um restaurante devido a uma disputa entre gangues. Sua chegada ao novo local de trabalho é marcada por sua arrogância. Incorpora uma mistura bizarra de paladino dourado da justiça com as virtudes de um maníaco depressivo com picos de egocentrismo. Pudera. É um polaco saído da guerra do Vietnã. Salve quem deu um distintivo pra esse psicopata. O cara entra em cena nas ruas de Chinatown debochando sarcasticamente da população e da própria polícia local. Adentra o escritório dos chefões do crime locais, os desmoraliza e joga na cara deles aquele papo de “novo xerife na cidade”. E isso com um sorrisinho na cara de deixar qualquer monge budista louco da vida.

Tony Montana (Al Pacino em ‘Scarface, 1983’)

“Eu sempre digo a verdade. Até quando minto.”

Se traficar drogas é uma atividade perigosa, melhor ter esse cara no comando. O problema é que o sujeito é o tipo de traficante que também é consumidor. Tony Montana fugiu de Cuba, conseguiu comprar sua permanência nos Estados Unidos com sangue e logo fez os contatos certos subindo na hierarquia das drogas. O maltrapilho se tornou o rei da coca. Um verdadeiro coração de leão, Tony se manteve impassível enquanto um traficante partia ao meio seu conterrâneo cubano com uma motosserra no melhor estilo Leatherface. Isso sabendo que ele seria o próxim. Mas mesmo Scarface tem seus limites e se recusa a explodir um desafeto de seu fornecedor de drogas junto com sua esposa e filhas. Em retaliação sua mansão é invadida por dezenas de latinos assassinos. O que fazer? Cheirar uma montanha de coca, pegar suas amiguinhas e explodir qualquer um que apareça pela frente. É o maior massacre cinematográfico que já vivenciei.

Jimmy “Popeye” Doyle (Gene Hackman em Conexão frança, ‘The French Connection, 1971’)

“Popeye chegou! Coloquem as mãos na cabeça, se afastem do bar e encostem na parede. “


Popeye é um policial em uma Nova York que parece um cesto de lixo. O homem não goza de uma reputação muito confiável. Beberrão e mulherengo, seu instinto por vezes falha, seu caráter é duvidoso e suas investigações vez ou outra não dão em nada. Mas é mais obstinado que seus colegas e não permite que o culpado escape. Justamente as qualidades necessárias para acabar com uma rede internacional de tráfico de drogas. Esse cara poderia ser parceiro de Harry Callahan e sobreviveria. Essa pérola policial ganhou a humilde bagatela de 5 Oscars.